quinta-feira, 26 de abril de 2007
A gata blasé
Não me lembro ao certo como eles foram chegando. O fato é que chegaram. Sorrateiros, desconfiados, invasivos... chegaram. E aqui estão eles, os quadrúpedes da minha casa, que, com os bípedes, formam a minha excêntrica família. Otho Atônio e Jade Augusta são caninos e meio-irmãos. Ele é invasivo, espaçoso e ciumento. Ela, acanhada, ainda está reconhecendo o espaço e por ele sendo reconhecida. Eowin Maria é uma felina. Os ingleses diriam que é low profile, eu digo que ela é ... . Otho e Eowin estão comigo há algum tempo, já adivinham minhas chegadas e ausências, já pressentem minhas lágrimas, já antecipam os meus risos. São companheiros. São opostos. Ele é subserviente: olha-me sempre como quem implora um último carinho, humilha-se para ganhar atenção, morreria - fielmente - por mim. Comove-me e irrita-me. Eowin tem um ar blasé que chega a ser ofensivo: com a postura superior dos felinos, contempla, altiva, todos os subterfúgios de Otho Atônio para chamar minha atenção. Contempla e entedia-se. Olha para mim como a desculpar-se da atitude pouco nobre do colega. Distancia-se. Ela - e não eu - decide se quer carinho, quando e por quanto tempo quer. Eowin Maria está no controle. Levanta-se lânguida e afasta-se do meio de nós, os descontrolados. Isola-se no quarto, no parapeito da janela - desafiando, provocadora, a altura do sexto andar- na cozinha. Eowin só faz o que quer. Tem seu próprio tempo. Não faz concessões.É soberana, lenta e, apesar de ser uma nobre vira-lata, tem a postura dos eleitos. Otho pula sobre meu colo, quer lamber meu rosto, quer se sacrificar por mim. Eowin suspira, lentamente fecha os olhos, postura firme, parece dormir em estado de alerta. Acabado o show canino, ela levanta-se e se aproxima de mim. Quer carinho. Mas não pede. Não exige. Recebe aquilo que é seu por mérito. Logo se cansa. Abandona-me. Vou atrás dela, perturbo-lhe com minhas efusivas manifestações de afeto. Ela me desdenha. E eu entendo o óbvio: eu sou o Otho Antônio da Eowin. Sinto-me ridícula. Olho bem para a gata procurando captar-lhe a essência. Quero encontrar o ângulo exato do seu olhar blasé, quero ser lânguida e estar no controle. Oh, Deus, quero ser Eowin Maria!
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3 comentários:
Quero ser ela também!
=/
Os animais são mais legais que gente!
Acho que eu preciso de algum pra dar outra dimensão às coisas.
Estava com saudades do blog, e gostei do novo visual. Mais feliz.
Visite o meu qualquer dia também =)
Oh, céus! Saudade da método tereziano de ensinar literatura!
Um beijo!
É né Tereza...quem não quer estar, sempre, no controle! Também quero ter, a postura lânguida e altiva de Eowin.
Em busca da perfeição, ou do ar decisivo e confiante?
Não sei, talvez os dois.
Beijos, viu???
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