sábado, 31 de dezembro de 2005

Lentilhas e metafísica

Ano novo, vida nova! As vitrines estão abarrotadas de roupas brancas. Alguns, entretanto, preferem fugir à regra e nos ensinam: amarelo para atrair dinheiro; rosa, amor; verde, esperança... Já teve retrospectiva 2005 na tv em todos os canais. A corrida de São Silvestre está rolando. Em milhares de casa, há lentilha no fogo, pernil no forno e champanhe na
geladeira. Quem mora perto do mar, já preparou as flores e o fôlego para pular sete ondas. As linhas telefônicas estão congestionadas. Milhões de pessoas estão fazendo listas mentais de promessas de ano novo que, provavelmente, jamais serão cumpridas... Como vocês podem ver: ano novo, vida velha! Hábitos antigos são mantidos de forma ritualística... o que me deixa um pouco desconfortável com o reveillon. Acho que eu queria entrar em coma em 26 de dezembro e só acordar em 5 de janeiro... Não sei bem o que me enerva tanto: a sensação de que estamos andando em círculo... a retrospectiva... a ingenuidade de acreditar que uma noite vai apagar tudo... meu mau humor... não sei, mas sinto-me aborrecida. Será mesmo tão importante esta última noite do ano? Calendários não são apenas convenções? Penso que nós devemos nos renovar a cada dia, a cada minuto. Fazer listas de intenções mais viáveis de serem colocadas em prática. Desejar paz a todos os amigos em todos os momentos que os encontramos ou nos lembramos deles. Penso também que devemos fazer balanços existenciais sempre que estivermos em fila de banco ou do detran...(do detran, principalmente). Bom... mas vou deixar para pensar nisso mais tarde. Agora tenho de temperar a lentilha e passar minha roupa. Branca, é claro. Ano novo!!!!

domingo, 11 de dezembro de 2005

Chronos, Aristóteles e Brad Pitt

Hoje me bateu uma vontade de analisar os gregos. Acho que é porque há uma overdose de Tróia na HBO este mês e Brad Pitt de Ulisses...bem... analisemos os gregos. Primeiro, acho que eles tinham toda razão quando construíram o mito de Chronos. Esse senhor - entre nós chamado de Tempo - é mesmo impiedoso: devora um a um os seus filhos sem qualquer manifestação de remorso. É, Chronos, você anda me devorando. E, cá entre nós, não está sendo nem um pouco divertido... Vou fazer 41 anos próxima semana. 41!!! Resta-me o consolo de que se, como dizem, a vida começa aos quarenta, comemorarei meu primeiro aniversário. Ridícula essa história!!! Mas não é isso o que vem me irritando em Chronos: essa passagem irreversível das horas é minha velha conhecida, não me assusta mais. O que me irrita nesse Senhor é que, antes, ele era mais benevolente comigo. Andava num ritmo mais devagar, permitia-me acompanhá-lo... Hoje não: o sujeito desembesta e eu tenho de ir atrás tentando controlá-lo. Veja que coisa mais cansativa: correr atrás do tempo. E não para grandes ações, não! É para coisisinhas miúdas do dia-a-dia que, antes, eu conseguia fazer sem dificuldades com aquele senhor...Escrever, por exemplo! Chronos, Chroninho, lindinho... amigo, amigo... me dá um tempo, né? Voltemos à análise dos gregos... Segundo (pus "primeiro" lá em cima, tenho de pôr "segundo": é uma questão de coesão textual, entendem?) acho que alguns eram - sem ofensas, afinal quem não é? - loucos. Aristóteles, por exemplo. O sujeito, que era vivia de pensar, não devia ter problemas com aquele Senhor... parecia ter tempo de sobra para filosofar, criar, imaginar, delirar... não o culpo: se eu tivesse aquilo-que-não-tenho-pois-o-sujeito-grego-não-é-mais-meu-amigo, é provável que também pensasse loucuras de vez em quando. Pois não é que o Aristóteles resolveu rotular os seres humanos. Eu sei que ele não foi o único, mas, convenhamos, achava que ele estivesse acima dessas segregações. Vejam bem: você pode ser do tipo super-humano, virtuoso, continente, incontinente e bestial. Super-humano: você é um super-herói. Virtuoso: você faz o certo sabendo que é o certo e não vê qualquer possibilidade de fazer o contrário, aliás você nem vê o contrário (ou seja, você é um herói). Continente: você faz o certo embora tivesse querido fazer o errado. Incontinente: você faz o errado, sabendo que é errado, e tem (ohhhhhh desgraça!) culpa! Bestial: você faz o errado e não vê nenhum problema nisso! E aí, qual a sua categoria? Você é um pouco de tudo? Depende do dia, da hora, do outro? Por favor diga que sim!!! Eu não posso estar sozinha nisso! Aristóteles, me perdoe, mas acho patético esse negócio de sair clasificando homens e mulheres. Não só patético, mas simplista. Todos nós caminhamos do bestial ao super-humano, às vezes em questão de minutos. Tento ser virtuosa - acho bonito dizer "virtuosa": não parece denominar uma mulher acima de qualquer suspeita? Mas não sou mentirosa (essa é uma de minhas virtudes): na maioria das vezes sou mesmo continente - repressão demais na infância, criação pequeno-burguesa, sei lá... me bate uma paúra às vezes de fazer coisas erradas. Outras vezes, não: faço coisas erradas (na hora, não sei por que, elas me parecem certíssimas) de forma incontinente (odeio, porque me leva à culpa, sentimento detestável!) e de forma viciosa (sem culpas, yeeeeesssssss!!!). Mas esse meu lado bestial me assusta. Aliás, o lado animal do ser humano me assusta. Ver o homem se transformar num bicho, agir como um bicho, deixar de lado a razão e ser dominado pelo instinto (raiva, sexo, autopreservação... não importa): isso é assustador. De vez em quando, me deparo com uma situação assim. Confesso: não gosto. A minha tendência é recriminar do alto da superioridade de minha personalidade virtuosa: isso é coisa de animal! Homens não agem assim! Mas no meu íntimo sei que pode acontecer com qualquer um: sai de cena o homem e entra a besta. Fazer o quê?! Esperar passar a fase, sentir culpa, pedir desculpa, tentar reparar o estrago, prometer ter controle... Ah! e dizer para o Aristóteles: amigo, posso agir como um animal e não ser um, por favor, não me rotule por ser, simplesmente, humano! Ah! os gregos... prefiro o Brad Pitt. Me deu vontade de assistir agora ao filme O clube da luta. Será por quê?....