terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

O herói que Ela merece

- Vamos, amiga. Você vai se divertir...
Pronto. Aquela era a senha para encrencas: semre que alguém dizia isso, Ela sabia que algo bizarro aconteceria... Os amigos estavam empenhados, Ela não sabia por que, em tirá-la de casa e fazê-la se divertir. Para não ser anti-social, Ela disse "Vamos" com um frio na barriga.
Era uma festa de família. Uma grande festa: o avô da amiga completrara 90 anos, era preciso comemorar. Salão de clube, comidinhas e bebidinhas, uma banda meio decadente tocando músicas para quem faz noventa... Velhas matronas de laquê no cabelo, quarentões com cara de tédio, jovens dançando descompassadamente bolero, crianças histéricas ou sonolentas: era esse o cenário da festa. Ela lembrou-se que o seu conceito de diversão devia estar desatualizado. Mas entrou na onda: comeu, bebeu, dançou com um senhor rezando para que não fosse preciso lhe darem oxigênio ou usarem o desfibrilador no final do iê-iê-iê...
Como tinha ido de carona com a amiga, Ela esperou até o fim da festa. Eram três da madrugada quando entraram no carro. Ela, a amiga, a mãe da amiga, o irmão da amiga. Ela foi atrás com a jovem senhora. Já estava quase dormindo, quando ouviu um "Ai, meu Deus". Por causa do asfalto molhado pela chuva que assolava a cidade há dias, o carro se desgovernou. Rodopiaram na pista durante alguns segundos. Gritos histéricos rompiam o silêncio da madrugada. O carro parou. A jovem senhora e Ela estavam de cabeça baixa: não queriam ver o estrago. "Nós morremos, nós morremos", repetia a mãe da amiga. "Calma, senhora, está tudo bem", Ela dizia sem muita convicção. Ouviu o barulho de uma moto parando perto do carro. Não sabia escolher entre o alívio -era uma alma caridosa a socorrê-los - e o medo - era algum alma oportunista a assaltá-los. Ela levantou a cabeça devagar e olhou através da janela. Fechou os olhos. Abriu, olhou novamente. Definitivamente, a jovem senhora estava certa: estavam todos mortos. E no inferno! Desceu da moto jogando a sua capa para trás, num gesto teatral, adivinhem? Batmam! Na garupa, timidamente olhando a cena, o Robin. Batman gritava se todos estavam bem! Definitivamente, Ela tinha morrido. Batman ajudou todos a saírem do carro, ligou para a polícia, sugeriu chamar a ambulância. Ela riu da ironia: ambulância para mortos? Não seria mais adequado o rabecão?
Talvez fosse o sono, talvez a bebida, talvez a ansiedade despertada pelo octagenário prestes a morrer durante a balada de Roberto Carlos. Talvez fosse lentidão natural de raciocínio. O fato é que Ela demorou para entender a situação. Batman e Robin voltavam de uma festa gls que ocorrera perto do clube. Uma festa à fantasia. Passavam pelo local do acidente no momento fatídico. Batman disse a Ela, enquanto a abraçava respeitosamente, que foi "a coisa mais horrível que ele já vira: um carro rodopiava na pista e ele, impotente, nada posia fazer". Um batman impotente... não faltava mais nada. Tomadas as devidas providências (guincho, seguro, ocorrências), chamaram um táxi.Sem dúvida, a presença daquela estranho homem-morcego fora crucial no feliz desfecho da noite: Ela lhe deu um beijo de agradecimento. Viu de soslaio que Robin fez uma careta. Ainda perplexa com tudo, Ela viu Batmam chamar o parceiro e dizer-lhe que precisava de colo. Iria ter um ataque histérico. Decidida a preservar a imagem do seu herói da infância, ela entrou no táxi e encostou a cabeça no vidro, fechando os olhos. Não se lembra ao certo como chegou em casa. No dia seguinte, ligou a televisão num desses canais que passam seriados antigos. Encontrou o seu herói. Sorriu. A amiga tinha razão, afinal. Foi uma noite divertida!

6 comentários:

Newton Neto disse...

divertida mesmo!
hauhauhauhau
ri demais!

um beijo!

Anônimo disse...

Lembro de você contando essa história no fim do semestre passado no cursinho de Taguá! Descobri seu blogger...leio todosss! kkk! E depois rola o debate sobre o tema com a Estelaaa!
Beijo Tereza

Anônimo disse...

ai ai!!! bom demais vir aqui!
hehe
dah pra matar as saudades! parcialmente, é claro!
hehe
espero q esteja tudo bem com voce... e se nao for pedir muito, mais textos! Sao muito legais!

bjin

Anônimo disse...

Você é indubitavelmente sensacional!
E eu sou fã de carteirinha. Sem jeito, sem cura nem nada do tipo.
Pena ter demorado tanto a descobrir este espaço, Tereza!
Morro de saudades!
Um beijo,
Giordano.

Anônimo disse...

Tereza, toda vez q entro no seu blog, eu fico com vontade de ler mais crônicas escritas por vc, adoro todos.
bjs

Anônimo disse...

Rs... Ô noite divertida. E os heróis de infância... Ri muito! Legal o seu blog.
Beijos.